Vulnerabilidade social

Pobreza e alta natalidade oneram famílias sem condições de oferecer sustento digno a todas as crianças. Este é um dos principais motivos apontados pelos entrevistados como facilitador determinante da exploração sexual.

A psicóloga Maria Auxiliadora desenvolve um trabalho de fortalecimento de vínculos familiares no Centro de Referência de Assistência Social (CRAS). Ela explica que algumas mães, além de ter muitos filhos, precisam trabalhar o dia todo. Por isso elas acabam aceitando a ajuda de pessoas sem saber quais as intenções por trás desse auxílio.

Luciana Rocha, promotora de Justiça, esclarece que no caso da operação Boneca de Pano 2 os agenciadores visavam garotas pobres e menor grau de instrução, porque eram mais vulneráveis para cooptar. "Temos algumas regiões mais periféricas de Barra do Garças onde está muito nítido esse agenciamento de meninas muito pobres. Muitas famílias acobertam ou fingem não saber porque são beneficiadas ou mantidas com a prostituição da adolescente".

Ainda segundo a promotora, a maioria dos agenciamentos acontecem com menores. Há a tendência de se angariar adolescentes de baixa renda. Para Luciana, supondo que um programa custe 300 reais e a comissão repassada é 10%, as garotas se dão por satisfeitas devido à pobreza. Por isso, os agenciadores preferem meninas mais pobres.

Segundo Luciana, a exploração sexual começa na adolescência
Segundo Luciana, a exploração sexual começa na adolescência

Na tentativa de ajudar, a psicóloga explica que "além da orientação dada nos grupos, especificamente na área emocional, tem os palestrantes orientando sobre os direitos e deveres. Também tem a cesta básica que é oferecida [para os casos em que há carência de alimentação adequada]"

Desestrutura familiar

A exploração sexual precoce é algo consentido pelos familiares, o que potencializa o drama das vítimas. Algumas ocorrências apuradas pelo judiciário revelam que elas são entregues pelos próprios pais a abusadores ou exploradores.

Maria Auxiliadora psicóloga do CRAS narra a história de um pai que ofereceu a própria filha de 12 anos a um conhecido, porque alegava interesse sentimental na menor. Nesse caso, ela estranhou o comportamento do pai e resolveu contar para mãe que logo denunciou a situação ao CRAS. Auxiliadora explicou que o pai parecia ter outros interesses ao oferecer sua filha.

O ex-delegado da PJC de Barra do Garças, Weldeson Batista, fez parte da operação Boneca de Pano 1 e expôs como a ausência de estrutura familiar colaborou para a exploração sexual. Segundo ele, as garotas eram pegas em casa pelo taxista e levadas para os motéis, onde os clientes aguardavam. Quando o programa terminava, elas eram conduzidas novamente para aonde moravam.

Em depoimento acompanhado pelo delegado, uma vítima disse que se sentia segura quando estava com o taxista, mesmo sendo explorada. A ausência de proteção em casa era substituída pela suposta "proteção" oferecida pelo agenciador. "Como elas não tinham essa estrutura psicológica dentro da família querendo ou não elas encontravam com o taxista. Porque a pessoa que está sendo explorada, não se sente explorada. Ela se sente protegida. Isso aumentava o grau de vulnerabilidade" explicou Batista.

Sobre isso a promotora Luciana afirma que "na família está faltando essa proteção porque muitas vezes ela compactua e aceita a prostituição como forma de ela também ser beneficiada financeiramente".

O oportunismo de exploradores

Ao contrário da vulnerabilidade social vivida pelas vítimas, os exploradores não passavam por situação de miséria. Os dois principais suspeitos presos na operação Boneca de pano 1 tinham estabilidade financeira. Um deles era taxista e o outro empresário na cidade.

Andrea Guirra, investigadora da Delegacia Estadual de Defesa da Mulher (DEDM) de Barra do Garças, participou da operação Boneca de Pano 1. Ela explicou que o agenciador era um taxista com emprego estável em indústria local, por isso ele não precisava desse ganho para sobreviver. "Era uma pessoa que tinha trabalho, não era desesperado por dinheiro, mas era alguém que queria dinheiro fácil, oportunista" disse Andrea.

Três razões são apontadas pela promotora Luciana Rocha como causas que viabilizam a ação do agenciador. O lucro e a ausência de leis com penalidade específica para familiares constituem o principal motivado.

Para a promotora, o segundo motivo é a omissão das famílias. "O agenciador sabe disso e se aproveita, porque ele sabe que dificilmente essa família vai denunciá-lo, ela está sendo beneficiada pelo lucro da prostituição", argumenta Luciana.

Por fim, o calendário festivo de Barra do Garças também faz parte do conjunto de motivos. "O agenciador aproveita o momento em que há mais turistas, em que os hotéis estão mais lotados. Então, ele também vai procurar os momentos em que a cidade está mais lotada", afirmou a promotora.

A exploração foi vista desde o princípio como uma oportunidade de negócio. O taxista envolvido na operação Boneca de Pano 1 percebeu a oportunidade de ganhar dinheiro com a exploração sexual quando trabalhava numa indústria local.

O investigador Abel França, trabalhou na primeira fase da operação Boneca de Pano e esclareceu que o acusado estabeleceu os primeiros clientes no local de trabalho antes mesmo de ser taxista. "Houve vários casos em que a pessoa estava em São Paulo, muitas vezes fazendeiro ou empresário, e dizia: olha, a gente está indo para aí, vamos fazer um trabalho, ficar três ou quatro dias, e a gente queria fazer uma festa com umas meninas, queria que você organizasse umas meninas pra gente'', parafraseou França.
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