Operação Boneca de Pano 1 e 2
Taxista agenciava 60 jovens e crianças para clientes ligados à indústria da carne. Agenciador foi condenado por exploração sexual infantil e estupro ao manter relações sexuais com garota menor de 14 anos. Já cumpriu parte da pena e está na fase do regime semiaberto trabalhando novamente em seu táxi
As operações Boneca de Pano 1 e 2 foram empreendidas pela Polícia Judiciária
Civil (PJC) de Barra do Garças. Elas começaram com denúncias anônimas
realizadas por pessoas da cidade de Aragarças, a 5 min do de Barra do Garças, e através do Disque 100. A Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da
República criou o Disque 100 com objetivo de oferecer
proteção para crianças e adolescentes. O serviço está vinculado ao Programa
Nacional de Enfrentamento da Violência Sexual contra Crianças e Adolescentes.
Geralmente eram pessoas muito ligadas ao ramo do gado e também pessoas da cidade [de Barra do Garças], que tinham esse hábito de sair com as meninas", afirmou investigador Abel França
Quando a denúncia acontece a delegacia tem o dever de iniciar a investigação até que se elimine completamente todas as dúvidas sobre a possibilidade de haver um crime. Andrea Guirra, investigadora da PJC, participou da operação Boneca de Pano 1 e esclareceu que "a pessoa faz a denúncia [pelo Disque 100], ela vem para a delegacia por email e a gente é obrigado a responder. Então a gente tem que investigar para responder essa denúncia. É uma obrigação. Em seguida eu encaminho para o delegado e ele faz o despacho para o chefe de investigação para fazer as primeiras investigações", declarou.
A polícia recebeu a denúncia de um anônimo falando sobre um taxista e mais dois exploradores que estariam agenciando meninas em situação de vulnerabilidade. Os outros dois suspeitos não se tornaram réus por falta de provas.
As investigações começaram em setembro de 2012. "Nós tivemos a informação de que o taxista estaria fazendo isso e passamos a investigar" disse o agente Abel França. Mesmo com recursos escassos, a equipe policial formada inicialmente por cinco profissionais usava os próprios veículos para realizar o trabalho.
O efetivo inicialmente era pequeno, mas no final das atividades aproximadamente 40 autoridades policiais trabalharam na investigação. Cerca de 40 pessoas foram conduzidas à delegacia para prestar depoimentos. Toda a equipe levou mais de 8 meses de trabalho até o encerramento do inquérito e a prisão do principal suspeito.
Várias noites foram
dedicadas para seguir o taxista, pois ele trabalhava no período noturno. Com a
evolução da investigação, foi possível constatar que o taxista recebia as
ligações dos supostos interessados, buscava as meninas em casa e entregava aos
exploradores em motéis e hotéis da cidade. Sobre isso, o ex-delegado da operação, Weldson
Batista, disse: "a gente percebia que ele largava elas no motel e ia embora, só
voltava na hora que ela ligava para buscar".
O nome Boneca de Pano adotado pelos policiais partiu da junção da fotografia tirada pelo investigador Abel França com a letra de uma música da banda Ira, boneca de cera. A imagem chamou a atenção, porque nela há uma menina com uma boneca na mão. Após ser explorada pelo taxista, ela foi deixada na beira da rodovia 070 que cruza a cidade e segue em direção à capital Cuiabá.
O ex-delegado da operação Weldeson Batista explicou que eles ouviam a música quando viram as crianças e tiveram a ideia de nomear a operação de Boneca de Pano. "A gente estava na sala e eu estava ouvindo uma música do Ira [Boneca de Cera] e também a menina que a gente viu descendo do táxi dele com uma boneca, em uma das nossas monitorias" disse o ex-delegado.
Os primeiros clientes levantados pelo agenciador nessa fase inicial da operação eram empresários de outros Estados e cidades que mantinham negócios numa indústria de carne da cidade. Alguns eram de Barra do Garças, mas a maioria vinha a negócios na cidade e aproveitavam o tempo para explorar vulneráveis de diversas idades.
Havia menção de que alguns hotéis da cidade, aonde vinham os turistas, tinham funcionários que participavam e davam o número do taxista, hoje condenado pela Justiça. Ele deixava cartões em variadas localidades", disse a promotora Luciana Rocha
O problema não se limitou somente às periferias, mas também acontecia em outros bairros da cidade. Funcionários de hotéis localizados no centro de Barra do Garças e em bairros considerados nobres faziam parte do esquema. Não foi possível confirmar o envolvimento dos proprietários dos hotéis na ocasião da reportagem.
Mas segundo a promotora Luciana Rocha, durante a investigação houve a "menção de que alguns hotéis da cidade, aonde vinham os turistas, tinham funcionários que participavam e davam o número do taxista, hoje condenado pela Justiça. Ele deixava cartões em variadas localidades. Então o que se imaginava, mesmo não conseguindo apurar, é que tinham funcionários de hotel envolvidos, [exatamente] onde ele deixava o telefone para angariar aqueles hóspedes", disse.
Uma garota de programa que não quis se identificar foi ouvida pela reportagem. Ela disse que um funcionário de hotel da cidade fazia agenciamento dela e de outras garotas. Entrevistamos o recepcionista, mas ele negou qualquer envolvimento em esquemas de exploração.
No entanto, relatou uma série de informações que coincidem com os dados apresentados. Ele disse com detalhes sobre a existência de um site (www.fatalmodel.com.br) em que as garotas são expostas, em fotografias sensuais, para atrair clientes. Ele falou ainda sobre a existência de garotas de programa entre 15 e 16 anos.
Além disso, explicou que os clientes procuram garotas nas recepções dos hotéis. "Existe vários tipos de meninas, desde as mais vulneráveis até as mais estruturadas, que você chega a não entender porque elas fazem aquilo", disse o recepcionista.
A medida que as denúncias aumentaram, a segunda fase da operação teve que ser iniciada em outubro de 2015. "Quando você começa a divulgar isso, começa a chegar mais casos ainda na delegacia, então a gente viu a necessidade de fazer a continuação dela", completou o ex-delegado Weldson Batista. Desta vez, o uso do celulares e aplicativos de rede sociais foi maior que na primeira fase da operação
Existe vários tipos de meninas, desde as mais vulneráveis até as mais estruturadas, que você chega a não entender porque elas fazem aquilo", disse o recepcionista
Os exploradores aproveitavam mais da vulnerabilidade social das vítimas na internet. A promotora Luciana Rocha explicou que os exploradores, "visavam mais garotas com grau de instrução menor, porque tinha uma renda menor e eram mais vulneráveis".